Assédio automobilístico

Jonas não admitia que Ana Maria voltasse sozinha para casa. Mesmo quando iam para seus encontros em carros separados ele fazia questão de escoltá-la de volta até que a visse atravessar a porta da garagem do seu prédio.

Na primeira vez que isso aconteceu Ana Maria ficou encantada, na segunda achou uma atitude bonita, depois começou a se irritar com o carro de Jonas na sua cola durante todo o seu trajeto e não sabia como dizer isso para ele.

Começou a mudar sua maneira de dirigir. Andava mais rápido, mudava de faixas, tentava atravessar os sinais no último momento do amarelo. Tudo para ver se conseguia despistá-lo.

Jonas estava sempre tão concentrado no carro de Ana Maria que não se tocou disso. O que ela fizesse à sua frente, ele repetia atrás. Duas vezes foi multado por ultrapassar o vermelho. Nem o dinheiro da multa, nem os pontos na carteira mudaram sua atitude.

Até o dia em que Ana Maria se irritou tanto que, ao olhar no retrovisor e notar que, apesar de suas manobras, Jonas continuava quase encostado no seu carro, ela resolveu dar um basta na situação. Em plena pista expressa da marginal, com o trânsito fluindo, ela brecou violentamente.

Não deu tempo para Jonas fizesse o mesmo e a colisão traseira foi inevitável. Abalroou o carro de Ana Maria sem nenhuma delicadeza. Não sobrou um pedaço de lanterna inteiro e a tampa do porta malas dela ficou parecendo uma escultura pós moderna.

Ela, que já estava irritada, saiu do carro soltando fogo pelas ventas. Como ia explicar em casa para o pai que tinha sido o namorado que acabara com o seu carro? Mandou Jonas de volta para casa (e, nessa situação, ele não teve como recusar a ordem) e foi para delegacia, onde alegou que o carro que batera nela tinha fugido do local do acidente.

Jonas teve a carteira cassada, pegou dois meses de cadeia (com direito a sursis) por fugir do local e omissão de socorro.

E foi a primeira pessoa processada por assédio automobilístico. Nunca mais poderia ver Ana Maria.

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