La nave non va

As brumas envolviam o cais. As montanhas eram apenas vultos sombrios cobertas pela neblina.

O barco estava pronto. Sófocles conversava com o capitão Paracelso, perguntando se seria conveniente sairem com aquele tempo.


Apesar do hermetismo trimegístico do céu, o capitão garantiu que a segurança não estava comprometida. O conforto sim.


Sófocles trocou meia dúzia de frases com Electra e decidiram zarpar em direção a Ítaca.


Nem piratas, nem borrascas, nem dragões vão me impedir...cantarolava Paracelso, enquanto os dois se acomodavam na proa.


A navegação foi tranquila. Sófocles e Electra admiravam a vegetação das ilhas por onde passavam e, eventualmente avistavam basiliscos sobrevoando as praias.


Chegaram a Ítaca para o banquete dos lictores. Degustaram mandrágoras, salsichas de javali de Erimanto regados a néctar e, claro, doses de ambrosia.


Na hora de voltar a chuva começou. Nada ameaçadora. Cobriram-se com suas capas e embarcaram.


Cansada, Electra, recostou no colo de Sófocles e adormeceu.


De repente Sófocles reparou que o barco que deveria passar a boreste da Cólquida seguia reto em direção aos penhascos. Olhou para a popa e viu Paracelso estático segurando o leme.


Apoiou a cabeça de Electra numa almofada e foi perguntar o que acontecia. Ao tocar no ombro do capitão ele despencou no tombadilho. Estava morto.


Sófocles imediatamente agarrou o leme e chamou Electra. Ela levantou-se assustada e, ao ver o marido conduzindo o navio, achou que era uma brincadeira.


Não era. O vento nordeste já tornava as ondas mais ameaçadoras e, ao longe via-se uma tempestade de raios.


Sófocles conseguiu desviar das pedras de Colquida como se fora um velocino.


Electra tentou chamar por socorro, mas o rádio capitão estava mais morto que o próprio.


Ao longe avistavam o porto de Lemnos, de onde partiram, mas as ondas impediam que se aproximassem dele.


Sófocles então virou o barco contornando o Helesponto e, numa manobra arriscada conseguiu encalhar na areia de Mamanguá.


Já anoitecia. Abrigaram-se no velho forte. Quando a tempestade passasse tentariam novamente voltar para casa.


Teriam dormido a noite inteira, tão cansados estavam, se não fosse pela aparição fantasmagórica de Paracelso no meio da madrugada.


O cadáver do capitão entrou cambaleante no forte, cantando aos berros: nem borrascas, nem dragões, vão me impedir...


Electra, num movimento rápido atirou sua bolsa em direção ao zumbi, que caiu morto pela segunda vez.


Dois dias depois a chuva passou. Sófocles enterrou o capitão no calabouço do forte, desencalhou o barco e voltaram para Lemnos.


E nunca mais permitiu que Electra saísse de casa sem a sua bolsa.

Comentários

Arimar disse…
Fábio.
Não pensaram num metereologista antes da aventura.
O que foi muito bom, pois nos valeu um linda história.
Fico cá pensando : O que haveria na bolsa de Electra ?
Beijos.
Taty disse…
Viajei no meio dos raios e das ondas...imaginei as montanhas e, lembrei de uma aventura na Juréia! Beijos
Fábio Adiron disse…
Arimar

Nunca se sabe o que existe na bolsa de uma mulher..

Taty

Cuidado com essas viagens, molham muito
clau disse…
Ler isto foi como estar assistindo a um filme de aventuras helenicas não degustando um pote de parcas pipocas mas sim o sabor delicado de um belo pedaço da ambrosia dos deuses.
Bjs!

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